sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

Planície do grou.

Os grous eram do Vale do Grou de Mação, ou do Vale do Grou de Vila de Rei, 28,5 km de distância. E assim ficaram comigo, sem mais voos, apenas toponímia de proximidade.

Feito o convite para os ver mais a sul, aceitei, mas antes de partir procurei saber mais dos que conhecia: em quantos topónimos estariam presentes de norte a sul? e variantes, mais ou menos dissimuladas, como Groeira em Aveiro, ou a surpreendente Alcaravela do Sardoal. Não avancei mais por falta de uma base de dados toponímica de Portugal, que estivesse disponível para consulta na Internet. 


Sem o suspeitar, o refrão do José Mário Branco dá o mote para o vaivém das suas existências:


Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei pr'aqui chegar
Eu vou p'ra longe
P'ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos p'ra nos dar

Não foi à primeira, nem teria que ser, pois nos ciclos da sobrevivência há tempo sem relógio e espaço sem fronteiras, para que a vida se transmita. Aprende-se o que é importante para estar vivo.


Entretanto escuto: estás a ouvir este som?... escrevo agora: é o vento a tocar um instrumento musical chamado árvore [descobrir qual a espécie], nas cordas da ramagem. Mais à frente a escultura, impessoal, letrada e hiperbólica, que espelha sombras na água, aquela hora do dia... letras!


Há que procurar, em campos esparsos de arvoredo... desfilam ao andamento oliveiras pé de elefante, fechadas em copas de tantas sevícias, a bem da produção!


Também há castelos: Moura e Portel, ficam para outras visitas, e Monsaraz, a fechar o nosso voo.

E quando menos se espera há bando no chão, a se alimentar...


E quando já não se espera, aparecem no ar, à procura de chão húmido para pernoitar...

O grou-comum, cinzento, de pinta vermelha na cabeça, como um i.

Obrigado José Carlos por mais um voo.

[desenho crane do livro Fermor]

domingo, 26 de janeiro de 2020

Estratos...

À imagem da capa juntei vaga memória do que tinha lido no passado...


À pintura do catalão Joan Planella juntei o que recordo de ter lido no segundo volume de A Sociedade Aberta e os Seus Inimigos, de Karl Popper, e que hoje não consegui encontrar, apesar dos sublinhados a lápis: é que já passaram décadas da minha primeira leitura integral, mas andará perto deste excerto da página 181:

«O terrível quadro que Marx traça da economia do seu tempo é por demais verdadeiro. Mas a sua lei de que a miséria tem de crescer juntamente com a acumulação não colhe.»

Também é certo que A Menina Operária está mais recatada nesta visão, aparentemente menos desumanizada, mas as horas de trabalho maquinal-infernal aconteciam, e levavam à morte por exaustão, por antecipação. Não encontramos aqui O Povo do Abismo [em inglês AQUI] de Jack London.

E também é certo que, nas palavras de Roger Scruton, do seu livro Como ser um Conservador, página 181 [coincidência]:

«o Estado só pode redistribuir riqueza se a riqueza for criada, e a riqueza é criada por aqueles que esperam obter uma parte dela.»

Não tem muito que saber, nem para onde fugir, meu caro Gustavo. Continua a ler a revista, e fica-te com estes dois apontamentos, a propósito da capa.


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Post scriptum

O ramo de alecrim é para a Roberta, que ontem colhi, sem saber o porquê [do que quase esqueci].



Este é o meu papel de parede no computador, feito hoje a partir desta FOTO e deste TEXTO, por causa desta EXPOSIÇÃO, que não sei se tem esta cadeira, que descobri por causa do ILUSTRADOR da capa de um livro. 



Tudo assim, estratificado.

sábado, 18 de janeiro de 2020

NADA[S]_MEU[S]_0012_INTERROGAÇÃO.


Há no desvio sinusoidal uma interrogação de forma


Proporcionada pelas pontas [pontes] entre planos



Letras que se procuram



Nos versos de cor, mais esbatida



No verde largo que atapeta: elephant's ears, chamam-lhe, prosaicamente, os ingleses

A "orelha" de Alexandre O'Neill, a propósito do sinal de interrogação:

Como uma orelha, abro-me
sobre um silêncio embaraçado...

Uma charada: com as minhas folhas se faz "chá".

Bergénia, ou Chá-da-Sibéria, é o meu nome comum.

Há flores no inverno... Romanza a Cristina...

segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

Espairecer...

Há aquela vontade/falta de jardim, de caminhar, hoje sem livro, só arejamento, pensamentos, e forma de levar algum olhar para casa. Mas a visita começa, obrigatoriamente, pelo interior. E assim vou revendo o que me apraz, como esta pintura representado a preparação e serviço do chá:



Pelo caminho vou espreitando pelas janelas disponíveis, hoje, mais do que o exterior que se vislumbra, sou uma flor de estufa, sentindo o calor no rosto, prestando atenção às vidraças riscadas... mantenho-me assim, ao escutar passos apressados a chegar, o som do obturador, literalmente, a disparar, e os mesmos passos a se afastar. Parcos segundos de caça furtiva. O que se ganha e o que se perde?



Uma descoberta do dia: o serviço tetê-à-tetê para chocolate:



Não resisto a fazer a transcrição do que descobri [AQUI], pesquisando depois em casa:
O tabuleiro é oval e apresenta no seu fundo uma reserva oitava, com uma reprodução da pintura de Rubens As três Graças [surpresa] realizada em esmaltes policromos. Esta pintura é rodeada por uma cercadura de folhas a ouro brilhante e mate, e pela figuração de dois jasmins. Por sua vez, pode-se ler no verso a inscrição “L´original peint par Rubens, se trouve dans la galerie de Monsr. Le Comte Ant. de Lamberg à Vienne; cop. Par Claude Herr. 1816.” que nos permite identificar, ao contrário do serviço do acervo do P.N.A., o autor. Bem como que a mesma foi realizada dois anos depois da estrutura do tabuleiro estar fabricada, uma vez que apresenta inciso na pasta o número 814 referente ao ano de 1814 mas a legenda refere o ano de 1816 como o da elaboração da pintura.As duas chávenas, tal como as do conjunto do PNA, seguem o modelo “jasmin”, em porcelana branca em doublée or e estão embelezadas no seu exterior por uma cercadura de folhas em ouro mate, e no interior, junto ao bordo, ostentam uma faixa branca com cercaduras de folhas em ouro que também figuram nas chávenas do serviço do PNA. Os pires que as acompanham, são apresentados em porcelana branca doublée or e são adornados com cercaduras de folhas em ouro mate.A chocolateira em porcelana branca doublée or assenta sobre um pé circular e expõe um bocal em forma de bico de pato com tampa amovível e encimada com uma pinha. A tampa apresenta uma corrente ligada à pega e, toda a peça é decorada a ouro brilhante e mate com cercadura de folhas no bojo. A leiteira, também, em porcelana branca doublée or não tem um formato distinto do anterior, nem mesmo em termos decorativos. Já o açucareiro, igualmente de porcelana branca em doublée or detém a morfologia de uma naveta apoiada sobre um pé oval que assenta sobre uma base retangular e todo o bojo é decorado com uma cercadura de folhas de ouro mate.
Continuando pelos pequenos prazeres: bebendo chocolate. A figura é apenas identificada como sendo um militar. De passagem, nunca esqueço de mirar as mãos, bem como o magnífico tampo de mesa em pedra, ao canto da sala, com incrustações coloridas e desenho geométrico, que hoje não me apeteceu fotografar [há ocasiões assim]:




Ou os frascos de chá, que me intrigam acerca da sua funcionalidade, por causa da abertura estreita. Estou tentado a comprar uma réplica, lindas AQUI, para testar.



Todo o "quarto de vestir" [Sala do Toucador] é um encanto, mas o lustre e o teto... [fico vidrado a olhar, de respiração prolongada... de saboreio].



Chegada à premissa: no Canal de Azulejos encontro estes remendos, que o ângulo de luz procurada acentua.



Quando vislumbrei lembrou-me o deck [foi a palavra que saiu no momento] de um paquete.



Perto do Jogo da Pela encontrei esta bola...



E o som da água que se estrela na queda, em luz difusa:



Ou a decoração natalícia das amargoseiras, sem folhas, com os frutos a apurar a cor: mais umas semanas e temos bronze.



Geometrias de caos, numa trama de azulejos e cabelos de árvores:



O escudo de Minerva/Atena [escultura de John Cheere] com a cabeça decapitada de Medusa, que lhe permitia petrificar os seus adversários em combate [AQUI, num artigo que traz à liça a mitologia e a poesia de Judite Teixeira, que descobri por acaso ao tentar saber mais sobre a ligação Atena e Medusa, bem como o texto de Sigmund Freud A cabeça de Medusa].



A fechar: a cruz do tempo.



Passeio e leituras improváveis, que certamente se renovarão a cada nova visita. Negativos?

Ainda não sei porque escrevi esta palavra, sendo certo que o que se segue é um negativo trabalhado, de um pessimista racional: autorretrato tentado.




A chegada e o anseio pelo, perfeito, acompanhamento destes pastéis de nata: chá e...



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Post scriptum

  • Sons: concorrentes, contrastantes, qual deles o dominante. Na terra e no asfalto.
  • Percursos recomendados, AQUI.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

Árvore de Natal Barca Bela.

Não lhe pensei a composição, aconteceu da necessidade de libertar espaço na mesa da cozinha, para a ceia de Ano Novo. A Roberta pegou nela e colocou-a na fruteira que trouxemos do Brasil, à uns bons anos atrás: peça de que gosto muito, pela sua beleza, na simplicidade de formas e materiais de construção, e na adequação à função, ou seja, o conceito de design em peça.

Hoje, pela manhã, dei por ela:



Talvez a cor de laranja das clementinas, compradas pela Roberta ontem, e o recordar das palavras de Eduardo Sequeira, que escreveu na sua Chronica no Jornal de Horticultura Prática XX (1889), páginas 18 e 19 [AQUI]:
«Mas entre nós o azevinho e o pinheiro não teem as tradicções do norte, e tanto podem elles servir para arvore do natal, como outra qualquer.Porque não se aproveita em Portugal, para esse fim, um ramo de laranjeira, com os seus fructos de ouro brilhando dentre a folhagem verde escura? As luzes e os brindes para a creançada realçariam mais na laranjeira do que em outra qualquer arvore, e se a isso se juntasse uma escolhida ornamentação de camelias, que n'esta epocha florescem a esmo no Porto, obter-se-hia uma arvore do natal bem nossa, cheia de bellezas e de encantos.»
Tradição, à data, recentemente introduzida no nosso país por D. Fernando II. 

E assim fui para a rua fotografar, à procura da luz e do cenário, o que em mãos logo me pareceu uma barca:



A Barca Bela do poema de Almeida Garrett:

Pescador da barca bela,
Onde vais pescar com ela,
        Que é tão bela,
        Oh pescador?

Não vês que a última estrela
No céu nublado se vela?
        Colhe a vela,
        Oh pescador!

Deita o lanço com cautela,
Que a sereia canta bela...
        Mas cautela,
        Oh pescador!

Não se enrede a rede nela,
Que perdido é remo e vela
        Só de vê-la,
        Oh pescador.

Pescador da barca bela,
Inda é tempo, foge dela,
        Foge dela
        Oh pescador!

in Obras Completas de Almeida Garrett, volume VIII, edição do Círculo de Leitores, 1984, página 63 [Folhas Caídas, início do Livro Segundo; digitado aqui, a partir do livro, por mim].

Umas semanas antes tinha descoberto outra: À PROCURA... 

Endereço ambas ao meu sobrinho Pedro, que hoje completa a sua volta individual ao Sol, no mesmo dia da nossa volta universal.


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Post scriptum
adereço natalício foi comprado por mim na Makro, achei um encanto. Arvorar a barca fruteira com ela, colocar lastro de laranjas, e algumas camélias brancas no convés, é o que projeto.