A primeira tentação foi posicionar o cavalete na torre da mesquita, de frente para a onda Atlas, à cálida luz, pela facilidade tonta bebida num título, imaginando bancas de alfarrabistas cá em baixo.
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Mas a Koutoubia não é posto de observação: interdita a quem não professa, nivela-se pela cordilheira, no jogo da perspetiva.
"Here in these spacious palm groves rising from the desert the traveller can be sure of perennial sunshine... and can contemplate with ceaseless satisfaction the stately and snow-clad panorama of the Atlas Mountains", escreveu sete anos antes, e pintou em finais de janeiro de 1943, concluído o acordo em Casablanca. Queria mostrar o que já conhecia, numa outra forma de diplomacia: o soft power.
O jovem Raul Lino não esteve em Marraquexe, andou por Marrocos em 1902 [ler páginas 164 a 168], 41 anos antes, aportando a Tânger, das tangerinas, procurando filamentos da medeia de tempo Ceuta–Alcácer Quibir: o voo de Ícaro da nossa história, o pecado da ambição tentada mas não consumada.
Na dor inconsciente esquecemos Marrocos, aqui tão perto. Grotescamente aproveitado por nós em passeios a Ceuta, para compra de casacos de cabedal, no tempo em que não pertencíamos à Europa Comunitária. E era vê-los no regresso, enchumaçados nos seu couros sobre couros, passando a fronteira, carregando a perspetiva de um lucrozinho fácil. A miséria da falta de ambição continuava. Grotescos éramos. Agora as misérias são outras: os que escapam em desembarques na costa algarvia, para uma vida melhor sonhada na Europa.
Os ciprestes espetados, que Winston pintou, tê-lo-ão impressionado:
Diz o poeta persa do século XII Saidi de Xiraz: «Perguntaram a um sábio: De todas as árvores assinaladas que o Altíssimo Deus criou, grandes e frondosas, a nenhuma chamam azad ou livre senão ao cipreste, que não dá fruto; que mistério haverá nisto? Ele respondeu: Cada árvore tem o seu produto e estação determinada, no decorrer da qual permanece vicejante e florescente, e no tempo que resta fica seca e murchada; a nenhum destes estados o cipreste se assujeita, conservando-se perenemente viçoso; e desta mesma natureza são os azades, ou religiosos independentes. Não ponhas o teu sentido no que é transitório, porque as águas do Djilah ou Tigris hão-de continuar a correr através de Bagodá ainda depois de ser extinta a raça dos califas; se tens na tua mão muito que distribuir, sê generoso como a tamareira; mas se nada tens para dar, então sê um azad, ou homem livre, como o cipreste». [AQUI, páginas 57 e 58]
Na cúpula do minarete da Cutubia [Koutoubia em francês] viu Reynaldo dos Santos a inspiração para a decoração da nossa Torre de Belém [AQUI, página 130]:
De resto ninguém de boa fé e senso crítico que conheça a Tôrre de Belém e os monumentos marroquinos, pode furtar-se, em face da célebre Coutobia de Marrocos, às afinidades evidentes da sua cúpula aos gomos (do séc. XIII) com as do nosso baluarte.
"The Tower of the Koutoubia Mosque" vai a leilão no próximo dia 1 de março de 2021.
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P.S. Vemos o que queremos ver, no preconceito e na ignorância, mas há sempre a razão que nos sobressalta: faz sentido? A varanda do Villa Taylor terá sido o pouso do cavalete.