domingo, 30 de agosto de 2015

Sobras de tempo.

Uma ausência, que não é de férias, mais parece antiférias, como a antimatéria, o oposto de um certo continuum, picotado relâmpago, ou rasgo de luz muito breve, por vezes violento e doloroso, ou calmo e prazeroso, mas de tão breve que passa, a dor e tudo o resto.

Neste rasgo de ausência, o meu continuum foi feito de obstáculos, que se foram vencendo é certo, mas à custa dos meus poucos rendilhados de luz, como o estar aqui, uma pausa que se inala ou se escuta, desenhar no olhar a linha do horizonte a quatro olhos, ou um poema que se lê ao deitar, quando o corpo exausto não é apenas «cadáver adiado que procria».

Dando espaço à perspetiva, não é muito diferente do que se passa numa vida, no entanto é preciso ter cuidado, o que passa pode ser nosso, e o que se nos vai passando?...

Ontem foi um resumo de rendilhados de luz, assim...

Guarda que bella...




Rumo
Autorretrato


Gentileza
Momento
O resto já passou, mas é bom que se não passe (que não se repita, a perda de tempo).

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P.S. Quarenta e duas voltas ao Sol, parabéns Cármen. O teu presente...

Texto retirado da Revista Gulbenkian Descobrir Março a Setembro 2015.

Foto-composição minha, que andou em bolandas, e que teve vários inícios, desde "O prato", "O que me mantém", e agora é tua.

domingo, 2 de agosto de 2015

O meu culto do chá.

É o momento, de preparar e beber, a pausa, a cadência, não cronometrada, interiorizada, o início ou o fim (do dia), uma certa noção de equilíbrio, acompanhado de pensamentos, palavras, cumplicidades,... sem pressa. No meu caso bastam 20 minutos para tudo isto.

Começa com a escolha do chá, preto ou verde, o resto são infusões, não são chá. Ambos da mesma planta, camellia sinensis, diferem apenas no processo de secagem das folhas (oxidação).





Os meus preferidos estão na imagem, bem como os utensílios que uso. Chá verde por enquanto só o "híbrido" Lemon Macaroon da Lipton, em saqueta piramidal (por isso não está na foto), e ao final do dia.

Como escolho?... no começo do dia o "rafeiro" Lipton ou o ambarino Ceylon, quase sempre a escolha é entre os dois, mas por vezes apetece-me o No. 1, um mitigado Earl Grey, que por vezes também apetece ao final do dia.






A água, parte importante desta relação, deve ser escolhida e tratada com esmero, Luso e Evian são as minhas preferidas, e nunca as deixo ferver. Quando começa um impercetível libertar de vapor, a fazer bolinhas, sem deixar "rosnar", está no tempo de apagar o lume e colocar o saquinho, uma invenção norte-americana, é aqui que o meu lado prático se sobrepõe a tudo o resto (também sou assim). A imersão deste dura cerca de 3 minutos, a cor âmbar vai-se definindo, intervalada por duas a três espreitadelas.





Vertido para a chávena, confirma-se a cor, o cheiro não muito intenso, e o açúcar fica por último. Uma colherinha só na primeira chávena, das duas feitas com o mesmo saquinho. Sabe-me melhor começar com um leve doce, e depois ficar só com o sabor do chá.





Ambas são temperadas com leite, fica "veludo" (não adstringente) no paladar, e a cor "aconchegante" (a superfície serena), e está pronto o presente (momento) que sorvo.





Tudo é feito por "cabotagem", a tentativa e erro que afina cor e paladar. Também gosto de cheirar o resultado final, uma a duas vezes por chávena.

Ainda não consigo preparar para ficar calmo, faço porque estou calmo, ou porque estou cansado, em que já não penso em nada, e fico só num esforço mínimo que me garante no final desfrutar e aconchegar... tão bom!... deixo de estar prostrado, a caminho do iluminado?... não creio, é apenas a rima, o brincar com as palavras. O meu culto do chá é assim, adjetivo e não nome.

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P.S.