A Raquel "mancha como ninguém" [página 22 do catálogo]... a paragona rude, o aparente conflito na palavra com a beleza do que pinta, a curiosidade de saber o que é a técnica da aguarela, e a companhia desafiadora [ou terei sido eu?] da minha irmã, levaram-nos à oficina de ilustração em aguarela, orientada pelo Tiago Costa [Programação AQUI].
Materiais, técnicas base, e começar a experimentar: literalmente manchar o papel, como deslizar o pincel, tentar controlar, procurar a intenção. Conseguir primeiro a homogeneidade da mancha, depois o ascendente clarear, ou o descendente escurecer, a diluição, o excesso, jogar com o tempo de secagem. Outros recursos, menos clássicos, para produzir texturas, definir limites mais ou menos precisos, demarcar áreas que se querem proteger.
O Tiago vai observando e orientando, ajudando a direcionar [educar] o nosso olhar, para que este desencadeie a ordem no cérebro de cada um, e imprima na mão o movimento, que por sua vez irá desencadear novo impulso visual, e tátil [só dei por ele agora, ao escrever, de tão absorto que estava no momento], recomeçando tudo de novo. Método de tentativa, erro e aproximação, consumação por etapas, em que se convoca, em torno do pivot [cérebro], sentidos e músculos, numa simbiose em que, às tantas, não se sabe quem influencia quem.
Apetrechados e experimentados no básico, avançámos para a recri[e]ação, tendo por base reproduções de obras da Raquel. No nosso caso não houve grandes dúvidas, obra escolhida, por razões diversas:
o rosto da jovem mulher de São Tomé, o feminino africano, no teu caso [Manuela]...
a mão no joelho... ainda fui tentado pelos pés, mas como estabelecer a ligação sem o corpo [complicava, e muito, no desenhar, e depois o manchar]. Encontrei algum sossego na simetria, descobri a cesta, pormenor bonito [e difícil, descobri depois].
A composição bem prosaica: mão na cesta, mas depois ainda veio a angustia de a encher, e acabou vazia. Desenho tosco, luz e sombras aleatórias, tempos de secagem obliterados, a mancha manchada, dificuldade em conter diluições no espaço definido, completa ausência de estratégia de pintura: definição e articulação das diferentes camadas/fases da pintura por forma a conseguir o resultado final. Resultado:
Não foi fácil, nem o esperava, efémero contato, fatal porque não tenciono continuar [nunca digas desta água não voltarei a beber], mas que me dá um novo olhar sobre as obras, no pormenor e na destreza de uma mão soberana como a da Raquel... mão inteligente.
A oficina foi concorrida, mas ficou por satisfazer uma curiosidade [falta minha, não me ocorreu perguntar]: quantos dos presentes visitaram a exposição? Públicos distintos, estanques ou osmóticos?
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