domingo, 17 de janeiro de 2016

O (im)previsto na «joyeuse entrée».

Final e início de ano fadado em Cascais, certamente no Cabo da Roca a começar um novo ciclo, e depois o disfrutar da vila sem pressa ou plano de maior. Nas malas o costume, na minha o «Guia Breve do Museu-Biblioteca do Conde de Castro Guimarães», dois livros de Stefan Zweig, e alguns artigos relacionados. Tinha descoberto a sua passagem pelo Hotel Atlântico (Monte Estoril), e queria saber onde ficava... deambulando, lendo, conversando.

No ano passado tinha descoberto (puro acaso), enquanto vagueavamos calmamente pela vila, a casa onde viveu algum tempo Mircea Eliade. O acaso este ano não estava nos planos, mas foi o que aconteceu. Não estive no Hotel Atlântico, nem li Stefan Zweig, acabei, acabamos, por descobrir Nicolás Muller e a Beatriz Manteigas.

Certa a passagem pelo Cabo da Roca, final de tarde, cheio de vida, não muito agreste, assim...


Olhando para sul, olhando para norte, um pouco à frente do...

Dia seguinte, Museu Condes de Castro Guimarães e Centro Cultural de Cascais, novamente o imprevisto no previsto. Premeditado o regresso a casa do Guia Breve do Museu (1952), e a visita à Exposição de Nicolás Muller no Centro Cultural, que desconheciamos por completo.

O que não estava nos planos foi a descoberta das quatro pedras epigráficas nos quatro vértices do claustro, à entrada do museu, sem autor, em quatro línguas diferentes, e que depois vim a descobrir serem de D. João Manuel, Alexander Pope, William Shakespeare e Pedro Calderon de la Barca, pela ordem em que as fui encontrando.



Entretanto aconteceu conversa com os funcionários do museu, e o Guia teve de «esperar» pacientemente, só depois percorreu as salas que estavam acessiveis, e foi feita a confrontação entre o que estava escrito e o que se tinha para ver. Por exemplo, faltavam ferragens no contador indo-português (móvel) e o «biombo chinez» apareceu noutro local, quando já dávamos como certo o seu «desaparecimento».



No Centro Cultural de Cascais as obras-primas do Nicolás Muller surpreenderam, e era o que esperava.



Mas surpresa mesmo foi os trabalhos da Beatriz Manteigas. Se a primeira exposição era, à partida, do meu interesse (Nicolás), a segunda (Beatriz) despertou logo a curiosidade da Roberta, e acabou por ser uma agradável surpresa para todos. Acabámos a andar (literalmente) a escolher qual a nossa preferida... para a frente e para trás, volta e não volta, mais de perto ou mais de longe...


A vitrine com os vários materiais de trabalho da Beatriz é simplesmente deliciosa... tanta coisa... apontamentos, desenhos, documentos, fotografias, material de pintura, a sua dissertação... pedaços da vida que passou, pedaços da Beatriz. É ao mesmo tempo comovente e fascinante, como crianças a olhar para um baú.



Esse dia terminou com «A Rapariga Dinamarquesa», quase de forma imprevista.

O fim do início do ano levou-nos à Coleção Masaveu no MNAA. Mais uma vez o previsto vai dar lugar ao imprevisto, na forma de desconhecido, certamente por ignorância minha, e que se traduz na descoberta de um grande nome da pintura espanhola: Joaquín Sorolla... Xoakin Soroya é a forma de pronunciar (a grafia é minha e não respeita as regras da IPA). É um dos quatro grande nomes destacados no cartaz da exposição, mas não dei por ele. O que não se conhece ignora-se. Só dei por ele quando fiquei em frente dos seus quadros. Foi o princípo de uma grande curiosidade, que ainda continua, e que estou a cultivar, ao ponto de olhar para Espanha com outros olhos. Posso dizer que Sorolla resgatou a minha curiosidade sobre Espanha, se é que alguma vez a tive verdadeiramente.

Parte do que vi de Sorolla...


A família de Rafael Errázuriz Urmeneta (1905) - Sorolla
Nadadores (Jávea) (1905) - Sorolla
O regresso da pesca (1908) - Sorolla
Vista de Toledo (1912) - Sorolla

São imagens do catálogo, que comprei uma semana depois, meramente ilustrativas e orientadoras, que requerem a leitura do texto que as acompanha, e o meu regresso ao MNAA para as contemplar, todas. Aqui o tamanho é igual, na realidade são muito diferentes. Esta última é a responsável pelo resgate que referi anteriormente.

Tudo isto é muito pouco para se ter uma ideia do trabalho, da importância, da vida de Sorolla. Ficam aqui sugestões de descoberta:

Mas a visita ao MNAA (Museu Nacional de Arte Antiga) começou assim...


Calvário (C. 1460-1465) - Joan Reixach

com o «sentido patético dos gestos contidos de dor». Cada um de nós deambulava, encontrava, chamava o outro, partilhava uma opinião. Gustavo ficou muito interessado nas naturezas-mortas.


Natureza-morta com objetos de ourivesaria (1624) - Juan Bautista de Espinosa

Esta, bem diferente, foi alvo da sua curiosidade. Mas Roberta também, a seguinte é a sua preferida...


Natureza-morta com flores e frutos (C. 1668) - Juan de Arellano

mas também o rosto, o olhar desta escultura... olha para os olhos...


São Diogo de Alcalá (1652-1658) - Pedro de Mena y Medrano

chamando a minha atenção. Outro quadro que junta preferências, eu e Gustavo...


Mercado de Valência (1901) - Santiago Rusiñol

ou o seguinte que o fascinou...


Paisagem de primavera (Anfiteatro) (1911) - Santiago Rusiñol

ou o seguinte, em que nos juntámos os três a ver o que aqui não dá para ver...


A Sagrada Família com São Joaquim e Santa Ana (1768) - Luis Egidio Meléndez

a cor sobre uma superfície imaculada... a cor, mas que cor... azul, amarelo, vermelho...

Leigos viemos... vimos e sentimos, alguma coisa de leigo cada um perdeu, o estar perto do belo nos enterneceu, nos provocou. No meu caso ficou um imenso desejo de descobrir mais, por isso senti a necessidade de comprar o catálogo, começar a ler, e voltar.

Ainda houve tempo de saltitar por duas obras e uma exposição...




e visitar o «SEQUEIRA NO LUGAR CERTO».

E foi assim o nosso imprevisto no previsto, que nos proporcionou uma entrada feliz (joyeuse entrée) no novo ano; diferente de «Joyeuse Entrée», subtilezas!

----------------------------------
P.S. O cabeçalho do blogue tem por base um excerto do quadro Malvarrosa de Sorolla, a letra é a P22Monet Impressionist. Monet que disse de Sorolla: o pintor da luz acima de todos os outros.