Rota d'o Crime do Padre Amaro |
sinistro... duas palavras contrastantes que desde logo me inquietaram: a tecedeira, que evoca as moiras da mitologia grega, que fabricavam, teciam e cortavam o fio da vida, e os anjos, crianças inocentes, neste caso indesejáveis... uma mortal teia de aranha... brutal.
A pintura que deu origem ao painel de azulejos está AQUI, a artista é a Silvia Patrício, e não deixem de ouvir a respetiva sonoplastia.
Para aliviar o resto do dia, e acreditem que fiquei "pesado", terminei a releitura de "O Culto do Chá" de Wenceslau de Moraes. Não sei porque o trouxe comigo, mas ainda bem que o trouxe. É um livro lindo, na escrita e no grafismo, do qual gostaria muito de ter um exemplar da primeira edição: páginas de papel japonês, impressas numa só face, presas por fios de seda... uma teia de encantos, e logo eu que não sou dado a estes preciosismos, de ser ou não ser primeira edição, mas abro aqui uma exceção, por esta razão. Se um dia tiver de me desfazer de todos os meus livros, certamente não acatarei a "ordem" em relação aos do Wenceslau... e do Sebastião... fazem parte de mim.
Mas a teia continua, com a primeira fábrica de papel conhecida em Portugal (1411), e o primeiro almanaque editado em Portugal (1496), ambos em Leiria. Mais tarde descobri que Tokushima, cidade onde viveu e está sepultado Wenceslau de Moraes, é a primeira das cidades geminadas com Leiria (5 de setembro de 1969, culminar de um processo que se iniciou em 1967).
Fonte: Associação de Amizade Portugal - Japão |
Reparem nos corvos do brazão de Leiria (vem logo à memória os corvos de Lisboa, no mar, estes em terra), e a lenda associada, ou a forma estilizada do brazão de Tokushima, parecida com a que vi numa armadura japonesa no Museu do Oriente (que me impressionou precisamente por ser uma forma estilizada, moderna, num objeto antigo... dissonante, intrigante).
O passado que se projeta no presente, mas que deixa o futuro em aberto, não deve pesar, mas libertar (ultrapassar). Apesar dos males do nosso mundo, os que vêm de trás, e os que criamos, vamos progredindo, a nudez da verdade vai criando o seu espaço, o que nos liberta. Não quero tecedeiras de anjos.
A estória que marca o dia é a "tecedeira de anjos", no corpo fica a alegria de calcorrear o Castelo de Leiria, com o livro do Korrodi na mão (Estudos de Reconstrução do Castelo de Leiria, Zurique, 1898). Roteiros há muitos, normalmente tenho os meus, mas nada que supere estes acasos que se nos oferecem. Há que não desperdiçar :)
Castelo de Leiria. Pátio interior e Paços Novos, vistos da Torre de Menagem. |
----------------------------------
P.S.
Do tempo dos mouros (ou moiros), diz o povo, à falta de melhor explicação, o que está perdido no tempo, envolto em mistério, sobrenatural, herança árabe talvez, mas que afinal é bem mais antiga, como podem descobrir aqui: Portugal, mundo dos mortos e das mouras encantadas, vol. I, II e III.
O livro "O Culto do Chá" "nasceu" em Uji: a terra do chá. Na forma de ilustrar temos no primeiro o "impressionismo do pincel", e no segundo (é um artigo) "a veracidade da placa sensitiva". Assim o quis Wenceslau, não vale a pena amputar como fizeram nesta edição ao não colocar as fotos que Wenceslau escolheu para ilustrar o artigo (não há desculpa, mesmo sendo uma edição de bolso).
Os lugares por onde andou Wenceslau no Japão (Kobe, Tokushima, Uji...); Tanegashima o local do primeiro encontro entre portugueses e japoneses, e Nagasaki, cidade iniciada pelos portuguese no Japão. Tóquio é o referencial.
A grande ponte: Armando Martins Janeira.
Sem comentários:
Enviar um comentário